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Mostrando postagens de junho, 2010

As coisas velhas passaram...

- Bom, pelo menos o telefone tá tocando... - Você tá ligando por quê? Diz que quer fugir, mas... Ela sempre diz que não era assim, que nunca se importou assim com ninguém, que ninguém antes tinha causado esse efeito nela, que nunca tinha sentido dor pra respirar, que o frio na barriga nunca tinha se transformado em soco no estômago, que nunca tinha feito tanta besteira, nunca tinha errado tanto tentando acertar, que nunca tinha forçado a barra desse jeito - mas foi sem querer, eu juro!-, que nunca... Ela diz que nunca tinha chorado tanto, nunca tinha sido tão fraca, tão burra. Nunca tinha visto o tempo passar tão devagar, nunca quis que o tempo se arrastasse tanto, nunca quis fugir tanto, nunca quis tanto aprender a mentir, a disfarçar... e ao mesmo tempo escancarar e gritar com todas as letras, sem as malditas entrelinhas, pra ver se assim conseguia uma resposta, um sinal de vida. E depois repetia aquela história que já tinha me contado várias vezes. - O tempo passou, ele já deve te

A Valsa

"Nós queremos uma valsa  Uma valsa para dançar..." Foram 54 anos de valsas dançadas. No início eles dançavam sozinhos, mas aos poucos foi surgindo uma ciranda ao redor do casal. Vieram os filhos, depois os netos e bisnetos. Tantas vozes cantando uma mesma valsa e fazendo ciranda para que eles dançassem...  A ciranda rodando e os dois dançando. Cinquenta e quatro anos e ela parou de dançar. O que aconteceu? Flores, lágrimas, velas. Foi em 1 de agosto de 2004. Ele ficou sozinho no salão, mas a vida continua e ele não podia parar de dançar. A valsa continuava tocando, e, mesmo sem par, ele dançava. "Mas se a valsa morrer   Que saudade que a gente vai ter..." Toda vez que eles cantavam e a ciranda rodava, ele cantava junto, baixinho, suspirando. Fechava os olhos e imaginava que ela estava com ele mais uma vez. Um passinho pra cá e outro pra lá, mesmo quando o corpo já não correspondia tão bem... Quase seis anos depois, no dia 14 de junho de 2010, ele parou de d

Quase (Luiz Fernando Veríssimo)

Ainda pior que a convicção do não e a incerteza do talvez é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi. Quem quase ganhou ainda joga, quem quase passou ainda estuda, quem quase morreu está vivo, quem quase amou não amou. Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas idéias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono. Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cór, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados. Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz.  A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada, mas não são. Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o ma